Thursday, April 27, 2006

Numa sociedade ideal, não existem subidas

Tive um sonho. Um pouco alucinado, sem dúvida derivado do cansaço, em que viviamos numa sociedade perfeita. E nessa sociedade, fosse qual fosse o nosso destino, o percurso para lá era a descer. Nada como a merda de caminho que fiz desde o trabalho até casa, de bicicleta.

O nosso país é hilariante. Somos pobres, mas temos um custo de vida alto. Uma das despesas do dia a dia é o combustível. Seria de pensar que em curtas distâncias, fosse preferível andar a pé, ou ainda, de bicicleta. Vivo a 5 km do local onde trabalho, não é nada de mais perder 20 min. e poupar uns trocos. Mas não o faço com frequência. Acho que não gostam de mim quando ando de bicicleta. O incómodo que causo aos condutores é tal, que tenho dificuldade em dormir à noite. O próprio sistema não gosta que eu ande de bicicleta. Quando estabelece um plano para reparar um troço de estrada, deixa a berma de fora, para poupar dinheiro. Devem achar que ninguém a usa. Sim, naquele estado, é capaz de ser verdade.

Segundo o código da estrada, uma bicicleta é um veículo. No entanto, com estradas onde mal cabem 2 carros em sentidos opostos, um veículo destes causa muito transtorno. Lá fora percebem isso, portanto são construídos passeios para peões e bicicletas. Cá, até se colocam sinais de trânsito a bloquear as bermas. "Perigo, zona de acidentes" - Ora foda-se, com um sinal à frente depois duma curva, você também estaria em perigo.

Não chega já ser sempre a subir, ainda um gajo tem que ir com atenção aos obstáculos, parece que estamos nos x-games. Também gosto dos camiões estacionados a ocupar a berma toda e metade da estrada. Enfim, quando estou cansado fico um bocado mariquinhas. Mas que gostava de cagar no carro e andar mais de bicicleta, gostava. Enfiem o euro e trinta e quatro o litro no buraquinho do cu, filhos da puta.

A compra da bicicleta teve piada. Fui ali ao Jumbo, olhei, vi logo o que queria. Era vermelha, moderna, CARA. Tudo o que se pode querer numa bicicleta. No entanto, antes que chegasse a senhora responsável pela zona, para a tirar do suporte aéreo inteligente, a 2 metros do chão, chega-me um brasileiro ao pé de mim com 2 amigos, e começa a fitar a mesma bina que eu. O vermelho puxa o olho. Ora, caralhos m'a fodam, podem entrar cá para dentro, mas acho que ainda existe algures uma lei qualquer que defende que sós os portugueses é que podem ter coisas boas. O gajo volta-se para mim e diz: "Sabi quanto pesa?" - Não, mas deve ser bué. "É bunita" - Sim, mas eu cheguei primeiro. "Num faix mau, tô só chekando" - Ainda bem. E a comentarem uns para os outros "bein legau pra mandá pró brasiu". Não há bicicletas no Brasil? "Sim, mas é caru, aqui fica ein conta". Foda-se, é a mais cara que aqui está.

Nisto chega a senhora, que me diz que a posso tirar eu mesmo (tava-se mesmo a ver), e também concordei que era melhor, tratava-se de uma rapariga, até me sentia mal de ficar ali a vê-la escavacar-se toda para tirar aquilo lá de cima. Nisto, os brasileiros perguntam: "Num tein outra?". Não. Só o que está exposto. Então bazaram. Volto-me para a senhora e digo: "Olhe, afinal vou tirar a azul".

Tuesday, April 18, 2006

Alemanha

O que é? Um país. Mais precisamente, um país que teve a honra de receber Minha Excelência, eu próprio, pelo período de 1 semana. E qual é o propósito de um blog, se não for para partilhar e relembrar mais tarde, as bonitas experiências da vida. Não poupando nos pormenores, como é óbvio.

Ora, para alguém que nunca gostou do conceito de entrar num avião, o planeamento da viagem podia ter corrido melhor. Ao invés de um vôo directo, encavaram-me (bonita expressão alentejana para descrever o acto que um sujeito pratica sobre outro, por detrás e com as calças do último em baixo) com escalas em Munique, a caminho de Leipzig (o destino). 4 vôos para ir e vir, o dobro da probabilidade de morrer. Agora pergunto eu: existe mesmo assim tanta necessidade de colocar a vida de alguém (p.e. eu, e afinal é o que interessa) que não se conhece, em perigo, além do necessário, para atingir o mesmo objectivo? Julgo que não. Adiante.

Esquecendo um pouco a viagem de avião (e uma de carro que fiz por lá, numa daquelas auto-estradas sem limite de velocidade, onde por várias vezes me vi forçado a rezar aos deuses e ao Eusébio para que o motor do mercedes gripasse, sem sorte, raios partam a tecnologia alemã), passo a descrever o que vi por lá. Cheguei de noite, a uma quinta, no meio do campo. Não se via puto, tive que esperar pela manhã para perceber onde raios estava. Saí, parei e olhei. Tudo à volta era verde, lembrava a primavera em Portugal, mas fazia mais frio que no Inverno. As casas eram parecidas às nossas, exceptuando pelas pinturas de guerra desenhadas nas paredes e os telhados em forma de capacete do Darth Vader (tenho fotos). Pus-me a caminho da vila mais próxima, cujo nome não me atrevo a pronunciar, pronto a dar uma olhadela aos stands, para ver se salvava um carrinho desta experiência maluca que é ir à Alemanha quando estão 25 graus em Portugal. Gostei do que vi, por pouco não me decidi a ficar por lá, a recolher o lixo, porque ao menos assim podia comprar um audi ou um bmw, já que aqui, como engenheiro, ainda vou de bicicleta para o trabalho quando o tempo "tá" bom para poupar uns trocados...

Nos dias seguintes, em casa ou na rua, o meu conhecimento sobre a cultura alemã aumentava a olhos vistos. Uma autêntica "esponja cultural", este homem.

Assim, aqui ficam algumas curiosidades que aprendi sobre aquele país:

Dos 100 canais televisivos, 90 eram em alemão. As casas não têm persianas, e o sol nasce às 5h. As portuguesas são MUITO melhores que as alemãs. Quando inquiridos, 100% dos alemães afirmam não falar inglês, mas descobri mais tarde que, se cagar na pergunta e começar directamente a falar, a maioria percebe e responde de acordo. Na páscoa, as árvores são decoradas com ovos, como se faz no natal, com enfeites. Os alemães também passam os vermelhos. Para eles, desde que não neve, está bom tempo para comer gelado numa esplanada. Lá os chapéus de chuva são para mariquinhas. Na cidade, chegas ao meio de um mercado de ciganos e apanhas wireless no teu portátil. A cerveja deles escorrega realmente bem, custa é 2,5 euros o copo. Muitos alemães deixam a porta destrancada à noite. Os polícias alemães são mais simpáticos que o resto da população. E finalmente, para acabar em beleza, ainda podes ir a uma disco alemã e ouvir Whigfield com o seu hit "saturday night".

Agora que já sabem onde é que eu estava metido, permitam-me partilhar convosco alguns momentos mais fora do normal que tive (não desesperem, dá para rir um bocado).

Às páginas tantas, vejo-me convidado para um casamento entre um português com uma alemã. Não presenciei o casamento, mas estava lá para o copo de água, só com o pequeno-almoço no estômago, a pensar na paparoca. Ora acontece que, sem grande justificação para tal, os alemães não se sabem casar, embora como nós, já o façam à muito tempo. E digo isto porquê? Após a viagem de hora e meia, já a barriguinha ia um bocado a dar horas, vejo-me chegado ao copo de água e... nada. Nem uns croquetes, nem umas fatias de pão. Só cerveja. E um gajo não pode dizer que não, ou ofende (aprendi isso no "padrinho"). E depois da cerveja, já ia mais outra hora e tal decorrida, o champagne. E como nem percebia muito bem o que se passava, só dizia "ya, ya". Longe de mim arriscar ser responsável por um incidente diplomático.

Finalmente, já a minha cabeça tinha um tamanho considerável, oferecem-me uma fatia de bolo dos noivos com um cafezinho. Bolo dos noivos? Antes da comida? "Isto será legal?", pensava eu. Não disse que não. Não podia. Adiante.

Já passava das 18h quando começou a cheirar a comida. A minha irmã já tinha ido ao carro malhar uns croissants que tinhamos comprado no lidl, e que supostamente eram para a semana toda.

Começa a malta a comer, self-service (admite-se?), quando chegam os animadores. Dois alemães que para sacarem reacção dos tugas tiveram que meter a música "love generation" do Bob Sinclar em repeat durante meia hora. Quando o noivo me disse que iamos ter um fadinho mais à frente, até chorei de emoção por ir ouvir cantar português.

Mas o melhor ainda estava para vir. Já que até aqui foi tudo ao contrário, só faltava mesmo aquilo que inicia qualquer bom casamento: A despedida de solteiro. Então, ao final da noite, arranca o bom striptease ao som de rammstein. Houve direito a uma ovação de pé. A rapariga merecia. Actuou até já não ter onde segurar as notas. Bravo. Por esta altura, não havia lá ninguém que não tivesse já a planear o seu casamento na Alemanha. Adiante.

Outra situação caricata que me aconteceu, foi estar um dia em casa a jantar (e lembrem-se, a malta não tranca as portas), quando me entra pela sala um puto alemão, não devia ter mais de 20 anos, a cair de bebâdo, a perguntar pela festa de anos da Tânia (seja lá quem for), isto numa quinta, no meio do mato, a quilómetros da civilização.

Já tinha ouvido falar de bebedeiras de andar 3 dias à procura de casa, mas nunca tinha realmente visto nenhuma.

Após termos confirmado que realmente ninguém nas redondezas conhecia o puto, o gajo nota que não éramos alemães, e pergunta-nos o que bebiam os portugueses. Quando soube que era vinho ofereceu-se para ficar. "Fica para outra vez jovem, vai lá à procura da Tânia". E ele foi.

Bom, acho que não fica muito por contar. Não me vou pôr para aqui a falar de monumentos ou derivados. Também não vou contar o que me ia na cabeça dentro dos aviões. Nem quando imediatamente antes da descolagem, passa por mim um mecânico com um alicate e uma chave de fendas. Ou quando o motor da esquerda não arrancou ao mesmo tempo que o da direita. Ou quando as hospedeiras insistiam em mostrar-me o funcionamento de um colete salva-vidas, ao invés de um pára-quedas.

Uma experiência para repetir? Dizer que não, ofende.